sábado, 9 de janeiro de 2021

Influência das Redes Sociais de Informação no Rádio...

Imagem reproduzida do site superatualizado.com.br e postada pelo blog para ilustrar o presente artigo

Publicado originalmente no site [revistas.usp.br], em 11 de agosto de 2020

Extraprensa - Cultura e Comunicação na América-Latina

INFLUÊNCIA DAS REDES SOCIAIS DE INFORMAÇÃO NO RÁDIO E NA VEICULAÇÃO MUSICAL

Marcos Júlio Sergl Karen Helena Bueno Lanfranchi

RESUMO

Com o surgimento da internet houve um deslocamento no processo de veiculação musical, antes restrita ao universo radiofônico e televisivo. Propomos uma reflexão acerca dessa descentralização possibilitada pelas Redes Sociais de Informação (RSI). Objetivamos identificar o papel delas no lançamento de novos artistas e na veiculação e recepção musical. Trabalhamos com pesquisa bibliográfica a fim de responder à questão: qual a relação das RSI com a veiculação e recepção musical no cenário brasileiro atual? Chegamos à conclusão de que as RSI revolucionaram o mercado musical, desde o momento da concepção da canção, até o processo de retroalimentação do compositor, proporcionado pela reação dos usuários.

Main Text

Introdução

Uma das características mais marcantes do século XXI é a constante transformação tecnológica resultante da internet, a Rede Mundial de Computadores (RMC), criada no final da década de 1950 para fins militares e amplamente divulgada e utilizada a partir da década de 1990.

A sociedade atual, denominada sociedade digital, utiliza tecnologias de interconexão mundial de computadores (internet) para se comunicar em tempo real a qualquer distância geográfica. A internet foi agregada ao cotidiano das pessoas, definindo a chamada era digital (MARTINO, 2015).

Este novo tempo é marcado por inovações e criatividade em nível global, proporcionadas pela internet. Há um anseio dos povos em transmitir seus conhecimentos, experiências e seus modos de vida. Foram desenvolvidos aparelhos e elaborados protocolos de comunicação, resultando na denominada cultura digital, também conhecida como cibercultura (LÉVY, 2010).

A cibercultura abriga um conjunto de técnicas, práticas, atitudes, modos de pensar e valores desenvolvidos no ciberespaço, meio surgido na internet. Ele define a infraestrutura da comunicação digital, o universo de informações, a navegação dos internautas e a constante retroalimentação desse universo, em contínua expansão e modificação (LÉVY, 2010). Com a globalização, cada nova invenção é rapidamente difundida no ciberespaço, mundo virtual repleto de informação, arte, lazer e cultura.

No contexto do universo radiofônico, o surgimento da internet possibilitou “desde o transporte do modelo sistêmico do rádio para a web até experiências sonoras acompanhadas de legendas em verbal-escrito e de imagens visuais estáticas” e a convergência das diversas mídias por meio das Redes Sociais de Informação (RSI) - Facebook, Instagram, Twitter - e da internet móvel - smartphones, tablets, notebooks, não se limitando o rádio mais às frequências tradicionais, se alojando cada vez mais na internet (TABOADA, 2012, p. 5).

A internet é vista como suporte quando serve de veículo de divulgação para outras mídias, um novo tipo de distribuição dos produtos originais da imprensa, do rádio ou da televisão, processados em linguagem digital. Enquanto meio de comunicação e informação, ela é o resultado da convergência de várias tecnologias digitais, unindo ferramentas e características próprias, como a hipertextualidade, a comunicação multimídia e a comunicação de massa individualizada (DELARBRE, 2009).

A internet tem sido considerada a maior novidade para o rádio, pois, independentemente de qualquer autorização governamental, amplia a possibilidade de transmissão para as emissoras tradicionais e permite distribuição de áudio exclusivo, tornando-se um recurso fundamental para novos entrantes.

A RMC representa uma possibilidade real de mudança da lógica tradicional de dependência do Estado, notadamente para os grupos que não possuem concessões. Nesse caso, as rádios on-line e as rádios virtuais, ou radioweb, são a saída.

As tecnologias da informação (TIC) estabeleceram, multiplicaram e fortaleceram as possibilidades de participação proativa no processo democrático, educacional, social e cultural, uma vez que, por meio da internet, com essas ferramentas qualquer pessoa pode se transformar em provedor de conteúdo.

Ocorre nesse processo uma alinearidade temporal da escuta proporcionada pelo uso de aplicativos móveis, conforme afirmam Santaella e Lemos (2010, p. 62): “a conexão é tão contínua a ponto de se perder o interesse pelo que aconteceu dois minutos atrás.” O poder de divulgar ideias e conceitos está ao alcance de todos e compositores e intérpretes se valem dessa tecnologia para divulgar sua produção musical.

A internet

Hoje, a programação radiofônica não é disponibilizada mais somente pelas frequências tradicionais. A informação é processada a partir de diversas fontes que interagem. Não podemos deixar de considerar que a internet vem constantemente se popularizando no país, e o acesso, antes restrito às camadas mais ricas da sociedade, hoje integra os hábitos de grande parte da população, sendo utilizado em metrôs e trens suburbanos, nos restaurantes, nas ruas, cinemas e igrejas, havendo quase uma onipresença dele em todos os lugares públicos e privados.

Uma das características mais marcantes e peculiares da internet é a possibilidade de interatividade por ela proporcionada. O conceito de interatividade adapta-se de forma perfeita ao campo da informática. Os computadores tornaram-se cérebros eletrônicos digitais.

Esta interatividade possibilitada pelas novas tecnologias aponta a internet como a principal mídia interativa, pois mídias específicas da RMC, como as rádios e TV web, blogs (sites que permitem atualização constante por meio de acréscimo de conteúdo) e RSI, acabam por modificar o papel do rádio enquanto mediador e editor de conteúdo, pois ele e a televisão digital interativa encontram muitos desafios para sua implantação definitiva.

Convergência das mídias

O modelo de comunicação proposto por Harold Dwight Lasswell, sociólogo norte-americano, no qual um emissor emite uma mensagem a um receptor por meio de um canal e com um efeito, a partir do conceito de convergência, processo de integração das mídias a partir de um suporte, precisa ser renomeado, pois agora a comunicação percorre por diversos canais, com efeitos múltiplos, considerando a heterogeneidade da audiência em cada suporte.

Nelson Sirotsky (2006) situa a convergência como um processo iniciado há alguns anos, quando as mídias deixaram de ser alógicas e foram se digitalizando e sendo transformadas com a adição de novas aplicações a seus serviços.

Nesse percurso, o processo de evolução dos meios de comunicação e informação possibilitou um fenômeno de cruzamento com as mídias tradicionais, resultando em uma sobreposição e mistura delas em uma malha cada vez mais complexa de plataformas e meios. O exemplo mais palpável desse processo de convergência em um único suporte é o celular. Modelos 3G e 4G são capazes de agrupar mídia telefônica, televisiva, radiofônica, internet e ainda conteúdos multimídia do proprietário ou baixados da internet.

Os conceitos de convergência das mídias e convergência digital representam a fusão da tecnologia com a informática e as comunicações. Não podemos analisar convergência das mídias sem interligá-la à convergência digital, pois ambas caminham juntas.

Existem diversas definições para tratar de conceitos que se integram e fundem a atual realidade midiático-digital, dentre eles: 1. Multimídia - segundo Pierre Lévy (2010), é aquilo que emprega diversos suportes ou veículos de comunicação; 2. Ciberespaço - cunhado pelo mesmo autor, consiste no local virtual, o espaço de comunicação interconectado com computadores em todo o mundo. Notamos nessa última definição uma importância dada à internet e às suas possibilidades enquanto veículo de comunicação e informação. É exatamente nesse aspecto que seguiremos nossa análise de convergência.

Nair Prata (2009) afirma que ocorreu uma mudança significativa no campo das comunicações, pois a televisão, que se manteve durante cinquenta anos no ápice de audiência, atualmente perde sua hegemonia para a web e que os brasileiros ficam três vezes mais tempo acessando smartphones do que assistindo televisão, apesar dela ainda ser mais determinante nos modos de consumo de nosso país, aspecto que em breve também pode ser revertido.

O rádio no universo midiático

A afirmação de que o rádio seria ouvido por meio de outra mídia, além de um receptor fixo, poderia ser considerada loucura na década de 1950, mas essa leitura tem sido constantemente modificada devido aos avanços tecnológicos que o atingem. Atualmente, os ouvintes adaptam seu hábito de ouvir rádio às suas necessidades. Cumpre diferenciarmos aqui o rádio analógico do rádio digital. Renato Ávila (2008, p. 39) define:

Uma rádio web difere de uma rádio tradicional pelo fato de realizar suas transmissões via Internet, isso essencialmente significa que você poderá ter acesso à sua estação de rádio apontando seu navegador para o endereço em que se encontra a referida estação, ou através da utilização de programas específicos para esse fim, como o Real One Player, Winamp, Windows Media Player, entre outros.

Nair Prata (2012) complementa sobre a radioweb: “tem uma homepage na internet por meio da qual podem ser acessadas as outras páginas da emissora. Na homepage aparece o nome da emissora, geralmente um slogan que resume o tipo de programação e vários hiperlinks para os outros sites que abrigam as diversas atividades desenvolvidas pela rádio” (PRATA, 2012, p. 59).

Quando se fala em navegador, podemos usar o termo browser, que é o portal de entrada da internet para qualquer site, e para acessar uma radioweb não é diferente.

A partir da homepage, página inicial ou página de entrada de um site da internet, são acessados os diversos links por navegadores, como o Internet Explorer, Netscape, Communicator, Firefox etc.

O ouvinte de radioweb deve ter um computador com equipamentos, hardwares específicos. Para se obter um bom resultado, é necessário possuir os seguintes periféricos: caixas de som, placa de som, um processador acima de 200 MHz, memória 32 MB RAM, e um modem de 33.600 Kbps (PRATA, 2012).

A convergência digital resultou em novos suportes, que levaram alguns ouvintes a se interessar por outros formatos, muitas vezes distantes da própria linguagem radiofônica. Hoje o ouvinte pode, além de ouvir rádio, entrar no portal, interagir com os locutores, baixar podcast, arquivo de áudio digital, geralmente em formato MP3 ou AAC, com imagens estáticas e links, e escutar a programação de rádio em tempo real pela RMC.

O rádio, que hoje pode incluir imagens, textos e gráficos, e não só o tradicional áudio, perdeu sua definição de mídia sonora e está em jogo a própria noção do que ele é. O display, mostrador que apresenta informação, de modo visual ou táctil, adquirida, armazenada ou transmitida, de um receptor doméstico ou de um automóvel, pode exibir várias informações complementares, como títulos de canções, nomes de intérpretes musicais, cotação do dólar, localização geográfica, previsão do tempo e informações de trânsito.

Tornam-se viáveis mensagens personalizadas de áudio, os radio-mails, sistemas de envio de conteúdo sem a necessidade de fios, em alta velocidade, permanentemente atualizados, com serviços de valor adicionado, convergindo rádio, telefone celular e internet.

Segundo Marques (2010), Nélia Del Bianco corrobora com a ideia de que os profissionais do rádio devem estar atentos para a realidade de que para continuar a existir ele deve se adequar às tecnologias que surgem constantemente.

O que se observa é o crescimento dos modelos convergentes, multimídia e interativos. Uma sinergia entre rádio, Internet e celular, vínculos da programação sincrônica da rádio analógica com o tempo real da Internet. A produção da mídia tradicional, desenhada para ser difundida e comercializada em uma única plataforma não tem futuro. É preciso avançar para transformá-la na produção de conteúdos transversais capazes de serem distribuídos e comercializados em unidades de tempo diversas e através de diferentes plataformas (MARQUES, 2010, p. 7).

Álvaro Bufarah (2003, p. 3-4) Júnior também enfatiza a importância desse novo processo de fusão entre a Internet e o rádio:

Ao analisarmos os novos suportes para a transmissão de áudio, não podemos deixar de lado os avanços trazidos ao rádio pelas tecnologias da Internet. Nesse contexto, percebemos que houve uma potencialização de ambos nessa fusão onde o rádio ganha o suporte multimídia e a Internet o imediatismo do veículo de massa.

A expansão das possibilidades de inserção de todo tipo de conteúdo na RMC e, consequentemente, nas plataformas radiofônicas, em formatos e tempos que mudam constantemente, obrigou os coordenadores dos cursos de Rádio e Televisão a ampliar a oferta de disciplinas na grade curricular de tal forma que algumas delas, antes consideradas pilares fundamentais da radiofonia, com carga horária significativa, tais como sonoplastia, roteiro e produção radiofônica, perderam espaço para outras mais próximas à criação e produção em novos suportes, nos quais a dualidade áudio/imagem se fundiu; e, regras relativas a cada um deles, tais como definição ideal do enquadramento da imagem e linguagem clara e concisa no áudio, foram colocados em segundo plano. O fundamental é o exotismo, a diferença, o experimental e a ousadia para atrair seguidores.

Devemos estar atentos para os conceitos a respeito de rádios on-line e off-line, definidos por Maria Lígia Trigo de Souza (2002). As emissoras off-line não disponibilizam o som ou veiculam programação na internet; a RMC serve apenas como portal para os ouvintes, eventualmente disponibilizando informações e serviços em texto ou imagens. Elas podem oferecer algum tipo de recurso em áudio, como vinhetas, trilhas ou mesmo músicas, mas não possuem programação específica para a RMC, por falta de estrutura.

Também não retransmitem o conteúdo em tempo real por streaming, tecnologia que possibilita a transmissão de áudio e vídeo pela internet, sem precisar fazer download, ou seja, baixar um arquivo e copiá-lo para o HD do computador.

Elas possuem sua frequência, ou seja, originalmente existem no dial. A manutenção de um site, mesmo que sem veicular seu áudio para outros públicos, garante uma presença inicial na RMC e serve para divulgar o nome da emissora, sua proposta e, claro, oferecer serviços para os internautas.

As emissoras on-line disponibilizam sua programação na RMC em tempo real. No caso de emissoras com existência anterior no dial e que além de seu sinal normal buscam desenvolver uma programação específica para a web, devemos pensar em uma hibridização de meios, quer pela combinação deles, pelo condicionamento estabelecido pela mudança de suporte ou pelas características da nova mídia.

Há dois tipos de rádios on-line: 1. emissoras que transmitem sua programação em frequências e utilizam a internet como extensão, com propostas de conteúdos específicos para a rede; 2. emissoras pensadas e que só existem no contexto da internet, são as chamadas rádios internet-only, webradio, netradio, rádios virtuais.

Jornais, revistas e demais empresas de mídias tradicionais também têm apostado na utilização das radioweb, pela possibilidade de ser mais um canal de informação com outras possibilidades de exibição de conteúdo. Desta forma, as mídias tradicionais ganham muito mais espaço para estender a programação e interagir com seu público.

A internet está servindo como cobaia no processo de transição das rádios e TV analógicas para digitais. Ele serve como teste para as emissoras nas formas de interatividade que advirão dessa mudança.

Luiz Arthur Ferraretto (2008) aponta a subutilização do som como característica das emissoras de rádio na internet, por trabalharem com uma interface hipertextual, com predominância de textos e imagens e a disponibilização de transcrições das entrevistas em emissoras de rádio on-line, enquanto o mais simples seria disponibilizar a própria entrevista em áudio para que o ouvinte pudesse baixar por podcasting.

Muitas emissoras já se atentaram para essa possibilidade e disponibilizam não apenas o áudio, como também conteúdos audiovisuais do próprio estúdio de rádio, enquanto a programação é veiculada.

Como é natural em toda fase de transição, há divergência de opinião em relação ao futuro das emissoras de rádio diante do ciberespaço. O jornalista Heródoto Barbeiro (2001, p. 34) profetizou a morte da estrutura radiofônica no início do século XXI ao afirmar que “com o advento da Internet, os aparelhos de rádio passarão para o computador. É nele que as atuais emissoras de rádio e TV vão ser ouvidas e assistidas”.

Isso não aconteceu e temos emissoras migrando para o sistema digital e outras já transmitindo integralmente nesse sistema, que permanecem no dial, com extensão para diversas plataformas, mas com predominância do som (BARBEIRO, 2001).

Os celulares, em suas constantes atualizações, têm se transformado como uma forte tendência na escuta de emissoras de rádio, de forma similar aos antigos radinhos de pilha. Daniel Marques (2010) mostra por meio da pesquisa realizada em Salvador no ano de 2009, quantificada no relatório Ouvintes de rádio: perfil, hábito e preferências, da Potencial Pesquisas, que 15,3% da audiência de rádio na cidade já ouvia sua emissora preferida pelo celular. Com certeza, este índice já foi ultrapassado, pois é uma tendência em contínuo crescimento.

O acesso do rádio pelo celular, pela diversidade de características dos usuários nesta mídia, mostra que é necessário adequar o processo de criação de programas, o tempo da e a própria programação para esse novo público, mais seletivo e inconstante. Luiz Ferraretto, em depoimento a Daniel Marques (2010, p. 7), chama a atenção para outro dado fundamental: “com o celular à mão, o ouvinte passou também a produzir informação e enviar às rádios”.

Isto exige um novo pensamento na produção dos programas quanto à sua estrutura, em particular no aspecto da interação. O ouvinte, com informações inéditas direto das cenas dos acontecimentos, deve ter prioridade em relação a estruturas engessadas, e entrar no ar no momento de sua ligação. Isto resulta em programas mais flexíveis e na necessidade de locutores com amplas possibilidades de improvisação.

Como a segmentação continua a ser fator determinante para a fidelidade do ouvinte, a interação e a convergência são definidas em função dessa fidelização. Tendo o jovem como público-alvo desta nova forma de recepção, é preciso investir em novas formas de fazer um rádio direcionado e incentivador na colaboração do ouvinte/usuário/produtor.

Cinthia D’Auria (2008), diretora de atendimento da área de pesquisa customizada de mídia, conteúdo e tecnologia da Ipsos Marplan Media CT, em parceria com o Grupo de Profissionais de Rádio de São Paulo, realizou uma pesquisa qualitativa com profissionais de agências de publicidade a respeito das características do rádio e das perspectivas futuras junto ao mercado publicitário, considerando o contexto de transformação das mídias e de seus consumidores e, segundo Bufarah (2009, p. 8), chegou à seguinte conclusão:

O material levado ao ouvinte através de vários suportes (AM, FM, celulares, MP3/4 e 5, players, Internet, Internet móvel, games on line, etc.) também poderão ser acessados em formato on demand, podcast, programa de compartilhamento de músicas, comunidades de rádios levando à criação de ouvintes-produtores de conteúdo interagindo diretamente com a emissora e com outros ouvintes [sic.]. Com isso, o modelo de negócios estabelecido no mercado de radiodifusão brasileiro e mundial terá de ser repensado e alterado para atender às novas demandas desse ouvinte-usuário.

De qualquer forma, o rádio continuará existindo independentemente dos novos formatos, se souber se adaptar às mudanças decorrentes das novas tecnologias da informação, segundo teóricos como Eduardo Meditsch (2001, p. 229):

Se não for feito de som não é rádio, se tiver imagem junto não é mais rádio, se não emitir em tempo real […] é fonografia, também não é rádio. É uma definição radical, mas permite entender que o rádio continua rádio (como meio de comunicação) mesmo quando não transmitido por ondas de radiofrequência. E permite distinguir uma web rádio (em que ouvir som basta) de um site sobre rádio (que pode incluir transmissão de rádio) ou de um site fonográfico. Minha aposta é que o rádio assim definido - um meio de comunicação que transmite informação sonora, invisível, em tempo real - vai continuar existindo, na era da Internet e até depois dela, e irá se aperfeiçoando pelas novas tecnologias, que estão por aí e inda por vir, sem deixar de ser o que é.

Devemos considerar, a partir da tendência atual de ouvirmos rádio pela internet, que as distâncias geográficas passam a não ter mais importância, inserindo-se assim o rádio no contexto global de aniquilamento do espaço pelo tempo. Uma guerra travada no outro lado do planeta é transmitida em tempo real, como se estivesse acontecendo à nossa frente. Neste contexto, é aplicado o conceito da desterritorialização, a partir do qual fazemos parte do espaço planeta Terra, sem fronteiras.

Outro aspecto fundamental diz respeito às possibilidades de conteúdos, pois o rádio deixa de ser um meio de comunicação exclusivamente sonoro, invisível e que emite som em tempo real (MEDITSCH, 2001). Novas possibilidades, como programação por demanda, podcasts e gravações em vídeo do estúdio de rádio são outras formas de conteúdo que o rádio expande para a RMC, já presentes nos portais das grandes emissoras do país.

Com os suportes tecnológicos que possibilitam as pessoas registrarem conteúdos em áudio e audiovisual de pequenos celulares e transmitirem em tempo real pelo sistema wireless, rede de computadores sem a necessidade do uso de cabos ou fios, a internet pode ser tão ou até mais imediata que o rádio, que perde o status neste quesito.

Letícia de Oliveira Fernandes Silva (2009) escreve sobre o uso da internet no site da rádio Jovem Pan FM de São Paulo, criado em 2000, com cerca de 60 milhões de visualizações por mês. Por meio de seu endereço eletrônico1, observamos que se trata de uma emissora on-line. Links e hotsites possibilitam o acesso à TV do Portal Vírgula, aos blogs dos locutores e membros do programa Pânico e às informações sobre o mundo do entretenimento.

O site apresenta as atrações: 1. Informação: sobre a equipe, locutores, paradas, lançamentos e o cenário musical e entretenimento; 2. Banco de áudio: com músicas para ouvir e comprar, programas e paradas, com a possibilidade de o usuário optar por uma programação própria; 3. Transmissão da programação ao vivo: por meio de Internet; 4. Vídeos: com entrevistas diárias, shows e clipes diversos.

Ao entrarmos na homepage da emissora, encontramos em sua parte superior os links, conexões de um recurso da web para outro, que funcionam a partir de duas extremidades, denominadas âncoras. A conexão é iniciada na âncora fonte para a âncora destino, que pode ser qualquer um dos recursos da internet, como imagem, videoclipe, slogan, programa, documento etc.

Os links da emissora funcionam como guias para o usuário navegar, e estão divididos em: 1. Entretenimento: inclui agenda de eventos (cinema, teatro e shows) da cidade São Paulo, promoções da emissora, interatividade (o ouvinte pode solicitar músicas que deseja ouvir na Jovem Pan), e o “Fique ligado” - link direto com os blogs, Twitter e sites oficiais dos membros do Pânico; 2. Música: com artigos sobre as novidades musicais e a possibilidade de ouvir quantas vezes quiser a “conexão Pan”, quadro sobre o mundo do entretenimento musical; 3. Na balada: espaço com promoções e conteúdo interativo reservado para os interessados na noite paulistana; 4. Na Pan: informações sobre novidades e bastidores musicais; 5. Pânico: com vídeos, entrevistas e programas gravados no “Semana em Pânico”; 6. Programação: informativo com a grade de programação semanal; 7. Promoção: informa as promoções da emissora; e 8. TV: sobre o programa Pânico, segundo dados obtidos em Silva (2009).

Ao navegarmos no site da rádio Jovem Pan FM de São Paulo, comprovamos que, neste caso, a mídia radiofônica deixou de ser apenas sonora. Temos a sensação de estarmos em um ambiente imagético que utiliza muitas cores, fotografias, áudios e vídeos, com soluções que nos levam a acreditar que a emissora tem a participação de profissionais de design, de vídeo e de outras plataformas sonoras e imagéticas em seu quadro de funcionários, pois a produção do site é interna. Esta análise comprova a fase de transição que o rádio enquanto meio atravessa.

Letícia Silva (2009, p. 32) afirma que o ouvinte tem participação ativa neste novo formato, atuando como usuário consumidor que pode opinar na estrutura da grade de programação da emissora:

Em um processo de intercâmbio através dos fóruns de discussão, salas de bate papo, correio eletrônico, votações, comentário de notícias etc., os recursos multimidiáticos possibilitam a interação do público com a estação e vice-versa, transformando o papel do ouvinte, que passa a fazer parte da construção dos programas e coprodutor da comunicação.

A veiculação musical

Paralelamente ao desdobramento do rádio para outros objetos midiáticos, vemos uma nova situação sobre seu domínio em relação à informação e à veiculação musical. A influência dos novos suportes possibilita uma análise na mudança de gosto nos ouvintes e novas oportunidades para os músicos. Frith (2006, p. 59-60) deixa claras as novas relações resultantes dos avanços tecnológicos.

A terceira revolução, a atual, está relacionada ao desenvolvimento e à aplicação da tecnologia digital ao universo musical. Essa tecnologia amplia a definição de proprietário de um produto musical - desde a obra em si (partitura), passando pela interpretação (disco), bem como pelos sons empregados (a informação digital) - e as possibilidades de roubo e pirataria. Além disso, ao mudar a composição digital desde a criação até o processamento - tornando o ato de criação musical uma prática multimídia -, intensifica a crise da noção de autoria, tornando mais difícil distinguir os papéis de músico e engenheiro, ou mesmo de criador e consumidor. Esta tecnologia afeta também a circulação e comercialização, produzindo o fenômeno da “desintermediação” (facilitando o contato direto do músico com o público).

Nair Prata (2012, p. 44-45) complementa, afirmando a independência dos artistas em relação à indústria fonográfica:

A radiofonia sempre foi o meio tradicional para divulgação dos artistas e suas canções. Com a internet, porém, os músicos estão criando e distribuindo suas obras numa relação de independência com a indústria fonográfica que vê, a cada dia, surgirem novos selos virtuais. Este movimento está determinando, inclusive, o fim do CD, já que boa parte da produção musical da maioria dos artistas pode ser facilmente baixada da web por download pirata ou via pagamento.

Neste novo processo, as grandes produtoras perderam seu monopólio na distribuição musical. Herschmann (2010, p. 169) afirma que,

analisando as estratégias desenvolvidas pelas majors nas últimas décadas - é que para obterem êxito ou menos fracasso, elas vêm estabelecendo parcerias com as indies, a mídia, formadores de opinião e fãs. Se, por um lado, constantemente nos deparamos com matérias jornalísticas que nos lembram que há uma crise da indústria da música, por outro, é possível constatar sem muito esforço que a música - ao vivo e gravada - é onipresente no cotidiano da sociedade contemporânea. Atualmente, a música gravada, em especial, acentuou sua capilaridade na vida social, e crescentemente vem sendo veiculada nos mais diferentes suportes analógicos e digitais, sendo comercializada não apenas como produto final, mas também como insumo para a composição de mercadorias ou na forma de produtos e serviços que são oferecidos direta e indiretamente aos consumidores.

Como as majors, gravadoras multinacionais de grande porte, que dominam 70% do mercado fonográfico mundial, divididos entre a Universal, a Warner, a EMI e a Sony-BMG, e as indies, gravadoras de médio e pequeno porte, também denominadas independentes, trabalham em parceria, na qual estas “descobrem” os novos artistas e as majors assumem aqueles “que tem potencial para fazer sucesso em uma escala massiva, (o que significa um amplo controle e exploração, por parte dessas empresas, das etapas de promoção, difusão e comercialização)” (HERSCHMANN, 2010, p. 170).

Um perigo que vem sendo apontado por estudiosos e profissionais da indústria fonográfica é a pirataria, que alterou a lógica do mercado e da distribuição de CDs, cuja queda na vendagem foi da ordem de 50% em um semestre, conforme afirmação de Aloysio Reis (EMI/Virgin). Esse novo cenário obrigou as majors a repensar todo o processo de distribuição de música pela internet (SANCHES, 2001; BALLOUSSIER, 2009).

As redes sociais de informação e a música

É fundamental incluirmos o advento das mídias sociais no processo de criação e veiculação musical. A música apoderou-se dos espaços virtuais conectados, fato que motivou os internautas a explorar as RSI, agrupamentos sociais on-line caracterizados por interesses comuns e que possibilitam o estabelecimento de relacionamentos interpessoais por meio das mídias digitais, como o Facebook, o Twitter e o LinkedIn, entre outras, para apreciação e promoção de novos artistas.

Nas mídias digitais são criadas subculturas, nas quais as pessoas compartilham dos mesmos gostos, crenças, valores, códigos e ideias e podem espalhar sua cultura para outros indivíduos conectados às RSI. Dessa maneira, elas alavancam o trabalho de novos artistas no cenário musical, pois integrantes da subcultura virtual, com a qual o artista se afina, partilham sua produção musical. Assim, o artista se populariza conforme outras subculturas virtuais compartilham os valores de melodia e estilo musical de sua subcultura.

Atualmente na cadeia produtiva musical, que compreende o ciclo da pré-produção (criação da música), da produção (gravação), pós-produção (mixagem e masterização), da divulgação (apresentação do produto), da distribuição (disponibilização no mercado) e da comercialização (consumo), existe uma intensa utilização das tecnologias.

O consumo musical e a consequente popularização de novos talentos, que antes era determinado em ciclos temporais prolongados, hoje, potencializado e difundido nos diversos espaços digitais conectados, como as RSI, passa a ser determinado pela disseminação em rede, que pode alcançar grandes proporções em questão de minutos. Para Lévy (2010, p. 141),

A dinâmica da música popular mundial é uma ilustração do universal sem totalidade. Universal pela difusão de uma música e de uma audição planetárias; sem totalidade, já que os estilos mundiais são múltiplos, em via de transformação e de renovação constantes.

A facilitação no processo da produção musical em um estúdio digital comandado por um computador pessoal resultou na multiplicidade de gêneros e estilos musicais e de artistas na era digital.

Para realizar esse processo de produção, é necessário um sequenciador para a composição, sampler para a digitalização do som, programas de mixagem e arranjo e sintetizador, que cria sons com base em instruções. Consequentemente, o artista controla o conjunto da cadeia de produção musical e expõe seus produtos nas RSI, quando, onde e como quer, segundo as suas potencialidades técnicas e digitais (LÉVY, 2010).

Isso tem levado os artistas que produzem e circulam fora do eixo São Paulo/Rio de Janeiro a construir estúdios em suas cidades, descentralizando a produção física da indústria fonográfica. “Jovens artistas […] investem cada vez mais em aparelhos e capacitação profissional para oferecer gravações, mixagens e produções de alta qualidade […], com o intuito de diminuir a procura por estes serviços em outros estados” (SANCHES, 2003).

A recepção é imediata e circula rapidamente entre os diversos grupos sociais virtuais. Dessa forma, “cada músico ou grupo de música funciona como um operador em um fluxo em transformação permanente em uma rede cíclica de cooperadores” (LÉVY, 2010, p. 144).

Portanto, o músico é transformado em ator principal na produção e veiculação de sua composição musical, e os ouvintes, elementos dos agrupamentos sociais virtuais, identificam-se com o trabalho do artista presente na sua subcultura virtual.

Do músico, não se espera que apenas componha e/ou execute música, além de marcar presença no rádio e TV divulgando seu trabalho. Os ouvintes o procuram no Twitter, Facebook e outras redes sociais, acompanham suas publicações em blogs e sites; se apropriam da sua música em vídeos amadores e manipulações sonoras como remixes, mashups ou simplesmente incorporando seus fonogramas em páginas pessoais ou disponibilizando suas gravações em sistemas p2p ou plataformas de compartilhamento (LIMA, 2011, p. 14).

Os músicos devem fidelizar os ouvintes, importantes catalisadores no processo de divulgação. Lima (2011) afirma que a popularização do acesso à banda larga permitiu a facilidade no compartilhamento de arquivos de vídeo e áudio e, juntamente com ações promovidas pelos músicos nas RSI, seu trabalho tende a ficar mais conhecido.

Para prolongar a relação com os fãs, o artista deve ter um blog, com uma página atrativa, na qual deve divulgar novos trabalhos e shows, lançar videoclipes, disponibilizar as letras das músicas e as mais diversas possibilidades de interação, que são quase infinitas.

Enfim, deve manter os fãs interessados em acompanhar constantemente suas atualizações. Apenas disponibilizar um álbum no ciberespaço não garante o sucesso. É preciso criar maneiras “de chamar atenção” do consumidor. Lembramos que somente no MySpace há mais de cinco milhões de bandas disputando espaço nas mídias digitais, conforme destaca Pinheiro (2009).

A disseminação das obras pelos artistas nas RSI e da pirataria no mundo inteiro, sobretudo após a popularização do MP3, leva Herschmann a acreditar que elas são uma resposta do público que não aceita pagar o montante exigido pelos fonogramas distribuídos pelas majors.

A música gravada, portanto, parece ter perdido valor, e a indústria até o momento tenta de alguma forma reagir a esta situação e sair da “crise”, adotando estratégias de intensa repressão aos sites peer-to-peer (P2P), que oferecem trocas e downloads gratuitos de música, e ao mercado ilegal de venda de CDs - aliadas ao emprego de ferramentas de controle de circulação e reprodução dos fonogramas, oferecidas pelas novas tecnologias. Apesar dos esforços das gravadoras em mobilizar diversas entidades em vários países, o mercado ilegal de música continua a crescer: estima-se que de cada três CDs vendidos no mundo um é pirata, totalizando, em 2004, aproximadamente 1,2 bilhão de unidades. No caso dos downloads gratuitos, o levantamento é muito impreciso, mas trabalha-se com a estimativa de que, em 2004, existiam 870 milhões de arquivos de música circulando na Internet […]. Ao mesmo tempo, de acordo com a IFPI, o Brasil figura entre os países que mais praticam a pirataria no mundo (está na categoria daqueles países em que a atuação ilegal já domina mais do que 50% do mercado), o que tem levado diversas entidades a se empenharem em minimizar este quadro. Curiosamente, mesmo as bandas e os cantores não parecem se opor muito a que a pirataria seja praticada (HERSCHMANN, 2010, p. 174-175).

Isto ocorre porque eles sabem que a RMC é fundamental para que sua obra fique conhecida e também porque ao tornarem conhecidas suas músicas, o público vai a seus shows, que é o que realmente dá lucro nos dias de hoje. Artistas, como Caetano Veloso, mantêm uma agenda de shows, mas espaçam cada vez mais o lançamento de CDs. Algumas gravadoras já inserem como cláusula obrigatória nos contratos a participação dos artistas também nos shows.

Outra forma de divulgação aberta ocorre com a Banda Calypso. O grupo nunca assinou um contrato com companhia discográfica, e graças a essa independência consegue vender milhões de discos a um preço extremamente baixo.

A própria banda incentiva a venda de seus CDs e DVDs nas ruas (9 milhões de CDs e 2 milhões de DVDs veiculados a partir de 1999), em um processo em que “pirateia os próprios discos. Os vendedores que correm ruas e praias do Norte-Nordeste com sistemas de som armados sobre carrinhos estimulam o público a ir aos seus shows, que são onde de fato Joelma e Chimbinha ganham a vida” (DAPIEVE, 2009, p. 33).

Em particular, artistas e bandas independentes, em início de carreira, que não possuem vínculo com grandes patrocínios e/ou gravadoras e assumem o comando das despesas de seu trabalho, desde a produção até a distribuição de suas músicas, usam a internet como meio de divulgação.

Basta criar uma página gratuita e fazer upload de suas músicas, utilizando sites como MySpace, Trama Virtual, Palco MP3, Bandas de Garagem, Last FM, entre outros. Nestes sites, o próprio cantor, ou grupo, é responsável por todo o material e formas de divulgação. O melhor é que o link pode ser divulgado por toda a RMC.

Muitos optam pela inserção de vídeos de suas apresentações ao vivo e cantando em casa no YouTube. O site Trama Virtual lançou o projeto Download Remunerado, cuja mecânica consiste no pagamento aos artistas de acordo com o número de downloads de suas faixas, cerca de R$ 0,10 por download, dinheiro investido por patrocinadores como a Volkswagen, Kildare e ABN Amro.

Além dessas páginas e perfis das RSI, aumenta cada vez mais o número de rádios na internet que tocam somente músicas independentes, a exemplo da 100 jabá Web Rádio. Nestes sites encontram-se todos os estilos musicais, sem restrição quanto a gênero ou segmentação.

Nesse contexto, as rádios perderam seu monopólio de divulgação musical. O chamado “jabá”, depois substituído pelo “contrato de veiculação” perde espaço para a veiculação das músicas na internet, uma vez que nesta não é preciso pagar para que suas canções se transformem em sucesso, ainda que em determinada fase da carreira, todos os artistas precisem pagar o jabá (SANCHES; MATTOS, 2003).

Um dos exemplos mais significativos é Mallu Magalhães. Em 2007, ao completar 15 anos, recebeu R$ 1.500,00, que usou para gravar quatro canções de sua autoria em inglês e colocou em um perfil na rede social MySpace. Em seis meses registrou mais de 850 mil acessos às suas músicas e em três meses teve mais de 1 milhão de visitas no seu perfil.

Em janeiro de 2008, Mallu Magalhães abriu o show do grupo mato-grossense Vanguart em São Paulo. Impulsionada por jornalistas presentes no show, “ganhou destaque nos principais jornais, revistas e sites noticiosos do país” (ANTENORE, 2008, p. 73).

Saiu do anonimato para a fama em curto espaço de tempo, sendo convidada para tocar em festivais de música independente, como o Jambolada, Eletronika, MADA, Coquetel Molotov, Gig Rock e o Planeta Terra, de cunho comercial. Então, recebeu propostas para gravar um álbum de estreia das transnacionais Warner, EMI, Sony-BMG, Universal e o selo independente brasileiro Deckdisc, mas não aceitou (ANTENORE, 2008).

Ela optou por seguir um caminho próprio, gravando e divulgando suas músicas de forma independente. Produziu um CD, editando ela própria as composições e fechou um acordo com a operadora de telefonia móvel Vivo, disponibilizando as faixas do álbum Mallu Magalhães para os usuários do sistema. Em 20 de outubro de 2008, o jornal Folha de S. Paulo noticiou o acordo.

a cantora lançou seu primeiro disco em uma ação de marketing com uma operadora de celular, que está vendendo cada faixa por R$ 1,99 em seu site. Além disso, cinco modelos de telefone estão sendo lançados com o álbum completo armazenado na memória. Em novembro, o CD chega às lojas (ESPINELLI, 2008).

É interessante observar que, ao lado dessa estratégia, ela fez circular um CD de forma tradicional. A Vivo ainda utilizou uma das canções como trilha sonora de um comercial de telefones pré-pagos.

Em 2009, lançou um novo CD vinculado à Sony Music, em parceria com a gravadora independente Agência de Música, que havia produzido seus discos. Ou seja, a cantora partiu de uma produção independente para, após ser reconhecida, ingressar no sistema tradicional de divulgação. O grupo Autoramas e a banda Cansei de Ser Sexy (CSS) também utilizaram a internet no início da carreira.

O radialista, crítico musical e pesquisador Fabian Décio Chacur (2001) cita o exemplo de vários artistas e grupos que se valeram da veiculação musical na internet para alavancar suas carreiras.

Ao disponibilizar uma composição ou disco na internet, evitam a intermediação. Outros tipos de comércio direto entre artistas, tais como vendas em sites próprios, na porta de shows e consórcio de ouvintes, entre outros, também têm se mostrado muito viáveis.

O lançamento do sétimo CD do grupo Radiohead, In Rainbows, comprovou mudanças radicais na forma de comercialização ao disponibilizar o disco inteiro em sua página na internet, com diversas opções de preço e kits. “O fã poderia pagar o que quisesse, a partir de nada. Se, no entanto, pagasse 40 libras (cerca de R$ 130,00 hoje), recebia em casa uma edição especial com In Rainbows em CD e em dois LPs de 45 rpm, mais um CD de faixas-bônus e dois encartes” (DAPIEVE, 2009, p. 28).

A possibilidade de venda direta, sem a cara intermediação da gravadora, aliada à questão de servir como teste de aceitação da música por parte dos internautas, aponta para novas possibilidades de veiculação, muito mais lucrativas. Alguns compositores, a exemplo de Leoni, no Brasil, têm lançado regularmente suas composições em seus sites. Se bem aceitas, vão fazer parte do novo CD. A opção de anexar faixas interativas e jogos de realidade virtual tornam a internet ainda mais atrativa.

Considerações finais

A partir da década de 1990, o rádio ampliou sua capacidade de armazenamento de informação e de transmissão em outros objetos midiático-tecnológicos, como celulares e computadores, nos quais já é possível o acesso pela internet, com interação e comunicação ativa em termos de sistemas de comunicação. Ocorre uma convergência desses sistemas, em uma rede global que adapta qualquer interface ou linguagem.

Isso se mostra uma ferramenta eficaz para o desenvolvimento do rádio, que permite a transmissão de som, ao vivo ou gravado, com baixo custo, podendo ser transmitido de qualquer parte para qualquer parte do planeta. A internet propõe assim uma democracia virtual que não podemos ter no ambiente real. E vai além, pois permite a qualquer indivíduo com um conhecimento técnico básico em web construir, independente de autorização estatal, uma interface virtual radiofônica, com acoplamento de conteúdos do tipo texto e imagem.

São as possibilidades de acesso e a facilidade que o indivíduo tem para construir um meio independente que faz esse universo da tecnologia da informação e da comunicação ser extraordinário. A estrutura de produção não deixa de ser fundamental para a qualidade dos programas. A mesma configuração é usada para construção, edição e veiculação.

Muitos autores defendem que o rádio está em extinção. Porém, a prática aponta para o percurso de que a internet vem para agregar possibilidades, viabilizando novas formas de transmissão e recepção. Alguns radialistas defendem a manutenção de arquivos físicos como forma de preservação histórica, a exemplo de Márcio de Paula, coordenador do Núcleo de Pesquisa Fonográfica e da Discoteca da Rádio Gazeta (ARTUNI; BASÍLIO, 2019).

Entre as desvantagens, citamos a pirataria descontrolada que vagueia por esse meio, com poucas expectativas de descobrir de onde vem determinada rádio pirata dentro do espaço virtual; e, também, a perda de imaginação que as pessoas têm em relação ao rádio analógico. Por não haver imagem pronta, a imaginação ficava por conta do ouvinte. Com as rádios digitais, as imagens são produzidas e transmitidas de forma engessada.

Para os compositores, intérpretes e produtores musicais, a internet, e particularmente a radioweb, mostrou ser um terreno fértil e democrático, no qual todos podem expor seu trabalho, sem as rígidas regras impostas pelas gravadoras. Para obter sucesso, dependem exclusivamente da aceitação dos usuários/receptores/produtores. O velho tripé produção-veiculação-comercialização intermediado por uma gravadora tornou-se extremamente caro, fora das possibilidades financeiras de quem inicia uma carreira.

Por outro lado, a internet facilitou o acesso, democratizou a produção e a troca de informações. Utilizando as ferramentas adequadas, o artista pode disponibilizar suas músicas gratuitamente para serem compartilhadas com todos os demais usuários, sem ter que pagar os custos fixos para as gravadoras e os custos móveis para as mídias massivas e as RSI têm se mostrado o espaço ideal para estabelecer a ligação entre ele e o consumidor.

Houve uma mudança nos paradigmas sociais e comerciais nas RSI utilizadas pelas bandas de MPB, na interação entre ouvir, gostar e comprar. Esse processo torna o fã tanto um consumidor, quanto um divulgador das bandas. Logo, nas RSI, a divulgação e a veiculação se retroalimentam.

Nos dias de hoje, com a pandemia e a consequente quarentena, sem possibilidade de realização de shows ao vivo, os artistas e empresários estão se valendo das lives, em uma nova construção simbólica da música como fator de reconexão social, de uma “aproximação” virtual com os vizinhos por meio da performance caseira. Vários artistas já começam a discutir a questão de como “vender” suas lives (LIVES…, 2020). Esse novo espaço de ressignificação pode ser outra possibilidade de monetarização, forçando a indústria fonográfica e as mídias a repensar todo o processo da veiculação musical no espaço virtual.

Texto reproduzido do site: revistas.usp.br

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