sexta-feira, 3 de outubro de 2025

Tanuza Oliveira ENTREVISTA Magna Santana

Entrevista compartilhada do site JLPOLÍTICA, de 1 de outubro de 2025

Magna Santana: uma voz feminina, ativista e sempre firme na defesa de direitos iguais

Magna: “Conquistamos espaço, mas temos que lutar diariamente para permanecer nele”

Por Tanuza Oliveira *

A voz firme que há quase três décadas ecoa no rádio sergipano carrega muito mais do que informação: carrega história, resistência e compromisso. Magna Santana, radialista com pós-graduação em Jornalismo Político, é uma referência na cobertura política e da vida sergipana. 

E não é à toa: são 29 anos de atuação ininterrupta marcados pela paixão pelo rádio e pela convicção de que o jornalismo é ferramenta essencial para fortalecer a democracia. E, em virtude disso, é muito querida e respeitada.

Seu primeiro desejo para o universo radiofônico era simples: comandar um programa musical. Mas a rotina de repórter, vivida inicialmente nas ruas de Aracaju, mostrou-lhe outro caminho. 

A proximidade com os fatos, o contato direto com a população e, sobretudo, o olhar atento para a política a levaram a assumir um papel que, na época, ainda era raro para uma mulher. 

“A política sempre me atraiu por ser a arena onde as grandes decisões que afetam a vida de todos são tomadas. Cobri-la sempre me pareceu a forma mais direta de fiscalizar o poder e informar o cidadão”, afirma Magna.

O desafio, no entanto, não foi pequeno. Ingressar em um ambiente majoritariamente masculino significou atravessar barreiras invisíveis, mas persistentes. Magna conta que precisou provar repetidamente que firmeza não era sinônimo de agressividade, e que a sensibilidade, tão frequentemente vista como fragilidade, podia ser sua maior aliada.

“Era um constante teste à nossa capacidade. Tive que mostrar que estava ali para trabalhar, esclarecer fatos e conquistar respeito”, relembra. Mais do que conquistar espaço, Magna ajudou a mudar a pauta do jornalismo político sergipano. 

Para ela, a presença feminina traz novas perspectivas e amplia o debate. “Não apenas ocupamos espaço, mas transformamos o conteúdo. Trouxemos para o centro da discussão políticas públicas para mulheres, infância, assistência social e direitos humanos. Somos desafiadoras naturais do “sempre foi assim””, justifica a radialista.

Ao ser questionada sobre feminismo, Magna prefere não se prender a rótulos, mas deixa claro que sua trajetória é atravessada pela luta por igualdade. “Não me considero feminista, mas feminina, ativista e firme na defesa de direitos iguais. O feminismo não é acessório da minha carreira, ele se traduz na coragem de não aceitar um “não” como resposta definitiva e no uso do microfone para amplificar vozes femininas”, define. 

Magna, que atualmente é repórter e apresentadora na rádio FAN FM, reconhece avanços importantes, como a maior presença de mulheres no parlamento e em cargos estratégicos, mas não ignora os retrocessos, principalmente a violência política de gênero. “É um jogo de dois passos para frente e um para trás. As mulheres conquistam espaço, mas precisam lutar diariamente para permanecer nele com integridade”, diz.

E, nesse cenário, aponta para o papel fundamental da imprensa. “Somos espelho e condutoras. Precisamos refletir a diversidade da sociedade, dar destaque às vozes historicamente invisibilizadas e cobrar dos partidos e instituições que cumpram sua parte. Só assim construiremos uma política mais inclusiva e representativa”, resume a profissional.

Mais do que uma repórter, Magna Santana se consolidou como uma voz que inspira, questiona e abre caminhos para outras mulheres. Sua trajetória mostra que jornalismo e política não são apenas campos de poder e disputa, mas também de transformação - sobretudo quando são atravessados pelo olhar feminino. Essa entrevista exclusiva com ela vale muito a leitura. 

JLPolítica & Negócio - O que a motivou a ingressar no radiojornalismo e, especialmente, na cobertura política?

Magna Santana - Sempre fui apaixonada por rádio e o desejo após o curso de rádio era apresentar um musical. Comecei um estágio na Rádio Atalaia, como repórter de AM, mas estava de olho na FM. Ao fim do estágio me contrataram como repórter de rua pra cobertura geral, desde a bronca de rua até uma cobertura de solenidades oficias. Com o passar do tempo fui me distanciando cada vez mais do artístico e me envolvendo com o jornalismo, onde estou até hoje. Desde cedo, na universidade, me envolvia com lutas políticas acadêmicas, as paralisações, as manifestações de rua. A política sempre me atraiu por ser a arena onde são tomadas as grandes decisões que afetam a vida de todos. Cobri-la sempre me pareceu a forma mais direta de fiscalizar o poder, informar o cidadão e contribuir para uma democracia mais sólida.

JLPolítica & Negócio - Quais foram os maiores desafios enfrentados ao longo da sua carreira como mulher no rádio e no jornalismo político em Sergipe?

MS - O maior desafio, sem dúvida, foi entrar em um espaço ocupado eminentemente por homens. Os desafios raramente vinham de forma explícita, mas eram onipresentes. Havia um constante teste à nossa capacidade, um questionamento velado. Tive que provar, repetidas vezes, que minha postura firme e ética não era “agressividade”, mas capacidade. E que a suposta “sensibilidade feminina” era, na verdade, uma ferramenta poderosa para fazer perguntas mais profundas e ouvir além do discurso pronto. É assim até hoje!

JLPolítica & Negócio - Existe algum episódio marcante que simbolize sua luta por espaço e respeito no meio jornalístico?

MS - Não necessariamente um episódio, mas situações em que eu buscava sair na frente - a exemplo de coletivas -, iniciar perguntas que eram as vezes desconfortáveis, para mostrar que eu não estava ali apenas de “enfeite” e sim pra fazer meu trabalho, esclarecer fatos. Num desses episódios pediram minha demissão à Diretoria da emissora (risos). O que não se concretizou e ganhei respeito.

JLPolítica & Negócio - Como você enxerga o papel das mulheres na imprensa política, que historicamente foi dominada por homens?

MS - Vejo nosso papel como transformador. Nós não apenas ocupamos um espaço, mas mudamos a pauta. Trouxemos para o centro do debate um olhar diferenciado para temas que eram relegados, como políticas públicas para mulheres, infância, assistência social e direitos humanos. Nossa perspectiva muitas vezes questiona a lógica do poder pelo poder, buscando o impacto real das decisões na vida das pessoas. Somos desafiadoras naturais do “é assim que sempre foi feito”. A mulher na imprensa política é mais ousada, quebra o monólogo e instaura um diálogo mais diverso e, por isso, mais rico.

JLPolítica & Negócio - Você se considera feminista? Como o feminismo dialoga com sua trajetória profissional?

MS - Não. Eu me considero feminina, ativista e firme na luta pela igualdade de direitos e oportunidades entre homens e mulheres. O feminismo não é um acessório da minha trajetória. Não gosto de rótulos. Envolvo-me nas causas que acredito e busco o diálogo com minha carreira para me dar a coragem de não aceitar um “não” como resposta definitiva, para defender o mesmo salário pelo mesmo trabalho e para usar o meu microfone como instrumento de amplificação de outras vozes femininas.

JLPolítica & Negócio - O que ainda falta para que as mulheres jornalistas tenham igualdade de oportunidades e reconhecimento na política e na imprensa?

MS - A estrada ainda é longa. Falta, principalmente, a quebra do teto de vidro nas posições de chefia e na definição das linhas editoriais. Já temos um bom número de mulheres nas redações, nas reportagens, mas poucas nas diretorias. No rádio especificamente, o número é muito pequeno. É preciso que as mulheres não apenas reportem as notícias, mas também decidam quais são as notícias. Além disso, precisamos de políticas claras de equidade salarial e de combate ao assédio, que ainda é uma sombra em muitas carreiras. A igualdade só será real quando uma jovem repórter olhar para cima e ver uma paridade de mulheres e homens no comando, sem que isso seja uma exceção.

JLPolítica & Negócio - Como você analisa o atual cenário político de Sergipe em relação à participação feminina?

MS - Vejo um cenário de perceptível evolução. Temos mulheres ocupando cadeiras importantes na Assembleia Legislativa, nas Câmaras Municipais e em prefeituras, o que era inimaginável há três décadas. No entanto, ainda é uma participação aquém da nossa representatividade na sociedade. Muitas vezes, as mulheres que conseguem se eleger carregam um fardo de provação muito maior, com sua capacidade sendo constantemente posta à prova de uma forma que não acontece com os homens. A política sergipana está aprendendo a conviver com as mulheres, mas ainda precisa aprender a valorizá-las de fato.

JLPolítica & Negócio - Que avanços e retrocessos você identifica quando falamos de mulheres na política sergipana e nacional?

MS - Os avanços são inegáveis: as cotas proporcionaram uma porta de entrada, e hoje vemos mulheres comandando ministérios, secretarias estratégicas e comissões importantes. A sociedade passou a cobrar e a enxergar com naturalidade a liderança feminina. O grande retrocesso, no entanto, é a violência política de gênero. O assédio, a desqualificação baseada na aparência e os ataques misóginos nas redes sociais criam um ambiente hostil que afasta muitas mulheres com capacidade e talento. É um jogo de dois passos para frente e um para trás: conquistamos espaço, mas temos que lutar diariamente para permanecer nele com integridade e provar nossa competência.

JLPolítica & Negócio - Qual é o papel da imprensa na construção de uma política mais inclusiva e representativa?

MS - O papel da imprensa é duplo: espelho e condutor. Precisamos ser o espelho refletindo a verdadeira face da sociedade, o que significa buscar ativamente as vozes das mulheres, dos negros, da comunidade LGBTQIAP+, e dar a elas o mesmo destaque e seriedade que sempre damos às vozes tradicionais. E precisamos ser condutoras, ou seja, não apenas noticiar a sub-representação, mas pautá-la. Cabe a nós questionar partidos sobre a ampliação do número de candidatas e não se restringir apenas à cota, fiscalizar o uso dos fundos eleitorais para mulheres e, principalmente, narrar as histórias dessas lideranças com a profundidade que merecem, mostrando que a competência não tem gênero, raça ou orientação sexual. Só assim a imprensa cumprirá seu verdadeiro papel democrático.

--------------------------

* Articulista Tanuza Oliveira - É jornalista profissional. 

Texto e imagem compartilhados do site: jlpolitica com br

Nenhum comentário:

Postar um comentário